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5 de fevereiro de 2007

D. Albino Cleto em entrevista ao “Correio”


Campanha do "não" ao aborto
tem crtescido em Coimbra


O Bispo de Coimbra, D. Albino Cleto, responde a algumas dúvidas, apresentadas por cristãos da diocese, sobre o referendo ao aborto, no próximo dia 11 de Fevereiro. A palavra do Pastor Diocesano deve servir de orientação para todos os que querem estar de acordo com os ensinamentos da Igreja nesta matéria tão delicada.
Atento à campanha em favor do "não" ao aborto, que tem crescido em Coimbra, o Bispo da diocese, D. Albino Cleto, manifestou apreço pelos "grupos de cristãos que, nestas últimas semanas, se entregaram de alma e coração à causa da vida". Afirmando-se pronto a sacrificar tempo e trabalho, compromete-se com a luta "pela pessoa humana e o seu futuro", ainda que sempre num lugar de dinamizador e orientador. Lembra as associações e movimentos de apoio à maternidade e à mulher que existem no país e na cidade, como forma de responder às críticas de quem fala na ausência de acção prática depois da vitória do "não" no primeiro referendo e salienta a importância de perdoar e receber as mulheres que já fizeram um aborto, segundo o exemplo do próprio Jesus Cristo. Lamentando que a nossa sociedade resolva os seus problemas "metendo a cabeça na areia", aguarda com serenidade o dia 11 de Fevereiro, crendo que "Deus nos ajudará a abrirmos os olhos".


De que forma está a Igreja de Coimbra a participar na campanha para o referendo sobre o aborto?
Como sabem, constituiu-se, em Coimbra, um grupo de cidadãos em defesa da vida que se intitulou "Aborto a pedido? Não!". Recolheu mais de 28 000 assinaturas! Entre estes cidadãos figuram centenas de católicos. A sua presença e o seu generoso dinamismo têm sido a mais actuante participação da Igreja diocesana nesta campanha. Também nas Paróquias e através de Movimentos Apostólicos se desenvolvem muitas e apreciáveis iniciativas, sobretudo para a distribuição dos documentos da Conferência Episcopal e de outra literatura, para a organização de sessões informativas e de vigílias de oração.



O Bispo da Coimbra tem estado atento a esta campanha? Como avalia as acções que já decorreram e a forma como ela se tem desenrolado?
Sim, tenho procurado acompanhar de perto esta dinâmica: já visitei os dois centros que, na Baixa e na Solum, são ponto de irradiação para a campanha e já me encontrei repetidas vezes com grupos de cristãos que, nestas últimas semanas, se entregaram de alma e coração à causa da vida. Além disso, procuro acompanhar, diária e atentamente, o que a imprensa local nos diz, de ambos os lados da causa.



Tem evitado comprometer-se?
Se pensam isso, estão enganados. Procuro situar-me no meu lugar, orientando e dinamizando. Falei aos padres sobre o assunto em todos os encontros pastorais marcados no calendário diocesano, insistindo em que, nas celebrações litúrgicas, apresentassem a doutrina cristã sobre a origem e o valor sagrado da vida, bem como as consequências morais que daí advêm. Eu próprio o tenho feito. Pedi-lhes também, e nisso os acompanho, que, fora do altar, apoiassem os leigos que dão a cara pela vida considerada conforme os nossos princípios. Se o meu exemplo servir para alguma coisa, digo-vos que estou pronto, por amor à pessoa humana e ao seu futuro, a sacrificar parte do meu tempo, do meu trabalho e até de algum dinheiro se tal for preciso.
Há leigos empenhados na campanha a favor do "sim". Como interpreta este facto?
Não me pertence julgar em público a consciência de ninguém. Admito que eles, sem quererem aprovar o aborto, tenham ideias diferentes daquelas por que me bato, relativamente à missão da Igreja na vida pública ou ao valor da vida humana no embrião… Não concordo com as suas posições mas respeito as pessoas que as tomam.


Sobre a pergunta do referendo: "Nunca redigiria essa pergunta, uma vez que considero que a vida não é referendável"



Concorda com os termos da pergunta que vai ser colocada ao eleitorado?
Não concordo. Nunca redigiria essa pergunta, uma vez que considero que a vida não é referendável. Mas. Se a entidade que teve de o fazer pretendia elaborar uma pergunta que não dificultasse o "sim", então a pergunta devia ser mais clara e frontal.

O limite de dez semanas não é, então, aceitável?
Nem dez, nem nenhuma! A este propósito, lamento que, em alguns debates, se tenha "ensarilhado" a discussão, questionando-se se o embrião é ou não "pessoa". Isso é fugir com a questão para fora do campo apropriado, na medida em que o conceito de pessoa, por muito que a Igreja o use e correctamente o faça, é um conceito de base filosófica, utilizado pela teologia e, sobretudo, de base jurídica, conceito de que precisamos de nos servir para esclarecer verdades e estabelecer regras. Mas ele evolui com os séculos, as civilizações, as escolas de pensamento… O que me interessa é saber se há ou não "vida humana". Ora, ainda há dia eu o escutava e via na TV, dito e mostrado num encontro de centenas de médicos que se reuniram no Porto: no embrião há "vida", naturalmente, "vida humana"! E se a ciência me diz que esta vida é distinta da vida da mãe, então eu concluo que há um "ser humano"! Aliás, se a ciência não o dissesse, eu sentir-me-ia obrigado a seguir o princípio da prudência, que me manda ter cautela máxima quando estiver em causa a hipótese de haver vida humana, no seu início ou no seu termo…


Têm-se ouvido críticas em relação à ausência de acções concretas de apoio às mulheres e à maternidade, depois da vitória do "não" no primeiro referendo. Como responde a essas críticas?
Respondo com duas afirmações. A primeira: faz-se muito mais do que se julga. Peço aos meus caríssimos entrevistadores que se dêem ao trabalho de realizar um levantamento das instituições e dos números que, só em Coimbra, são o fruto do que se tem feito. Lembro, de imediato, a Associação de Defesa e Apoio da Vida (ADAV), que, só no ano de 2006, acompanhou 144 mães e 162 crianças; lembro o Centro de Aconselhamento Familiar (CAF) ou o acolhimento de mães solteiras feito pelas nossas Religiosas Adoradoras do Santíssimo Sacramento e da Caridade… Isto o que, de momento, me ocorre, a funcionar em Coimbra, para não falar da porta aberta, mesmo para bebés, que em caso de aflição, há em cada uma das creches dos nossos centros Sociais paroquiais ou na Comunidade de S. Francisco de Assis… A segunda afirmação é a de que temos sido ingénuos, interpretando mal a frase do Evangelho: "Não saiba a tua esquerda o que faz a tua direita". O que Jesus quis dizer foi que não deveríamos estar a olhar para nós próprios, gabando-nos do que fazemos. Em ocasiões como esta é que percebemos o apelo de Cristo: "Brilhe a vossa luz diante dos homens, para que vejam as vossas obras e glorifiquem o Pai que está nos céus". A nível nacional, o que se tem feito, particularmente em Lisboa e no Norte! Recordo a "Ajuda de Mãe", a "Ajuda de Berço", "S.O.S. Vida – Apoio à Grávida", "Vida Norte" … Sei que há mais! Estou desejoso de que se publiquem estatísticas… E que Deus nos inspire e ajude para fazermos sempre mais…



Como é que a Igreja acolhe as mulheres que já fizeram um aborto?
Como Jesus acolheu a mulher adúltera: condenando o acto e salvando a pessoa que o cometeu, a quem se diz, como Cristo: "Não volte a pecar". Acredite que isto não é só teoria. No meu percurso de quarenta e sete anos de padre já absolvi diversas culpadas de aborto, propondo-lhes a penitência curativa que julguei conveniente. Não denunciei ninguém. Mas não escondo que, em algumas situações, vi lágrimas… E não calo uma verdade: por vezes, o grande culpado foi um homem que, explorando a fraqueza de um sim da mulher para um acto sexual, depois a pressionou com ameaças para que fizesse o aborto. Digam-me se aqui não há um culpado digno de castigo e quem é ele…



"Deverei sempre lembrar (aos cristãos) que a nossa conduta se orienta pela vontade de Deus e não pela lei civil"



Como vai aguardar o resultado da consulta popular de 11 de Fevereiro?
Com muita serenidade. Aos cristãos deverei sempre lembrar que a nossa conduta se orienta pela vontade de Deus e não pela lei civil. E manter-me-ei disposto a continuar a minha luta, que é a da Igreja, pela defesa e dignidade da vida humana. Esta é uma tarefa dos cristãos para as próximas gerações. Sim, porque, seja o resultado qual for no dia 11, vamos continuar a assistir a atentados à vida: no desfazer de famílias, na superficialidade irresponsável de muitas relações sexuais, na inconsciência com que se anda nas estradas, no modo leviano como se aceita a eutanásia… Sinto que a nossa sociedade ocidental resolve os problemas metendo a cabeça na areia: há droga? Abram-se salas de chuto. Há adolescentes a adiantarem-se em experiências de sexo? Dêem-se-lhes preservativos. Há dramas de muitas grávidas? Aconselhe-se e pague-se-lhes o aborto. Quer dizer que em lugar de procurarmos as causas das doenças para bem as diagnosticarmos e atalharmos na origem, ainda que isso requeira tempo e persistência, tratamo-las com analgésicos e pomadas… Assim não se cura o mal… Bom, creio que Deus nos ajudará a abrirmos os olhos. O que importa é que o façamos não em guerra mas numa atitude de procura humilde da verdade, adesão firme a ela e serviço amoroso dos que dele precisam.

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