Um rasto de luminoso brilho
Na tarde de 5 de Agosto, a luz, que aos poucos vinha enfraquecendo, acabou por extinguir-se de todo. "Foi um homem brilhante" – disse dele D. Albino Cleto, na Sé Nova de Coimbra, na missa concelebrada por cerca de oitenta sacerdotes da diocese. Muitos destes padres haviam sido, na juventude, iluminados por essa luz que agora se extinguiu ao sopro da brisa do tempo, para poder brilhar, mais cintilante ainda, no firmamento da memória de quantos, à sua passagem, foram assinalados pelo sacramento fraterno da sua presença.
D. Manuel de Almeida Trindade deixou, de facto, um rasto de luminoso brilho que marcou, umas vezes ao de leve, outras em sulco profundo, as pessoas com quem privou, os lugares por onde passou e o tempo que lhe foi dado viver. Foi brilhante como jovem estudante, enviado aos dezasseis anos para Roma onde cursou filosofia e teologia; foi brilhante como educador e como mestre, sendo nomeado vice-reitor do Seminário de Coimbra com apenas vinte e três anos, onde se manteve por mais de duas décadas, ensinando e orientando dezenas de alunos para o sacerdócio; foi brilhante como bispo, sendo escolhido mais de uma vez para presidir aos destinos da Conferência Episcopal e para representar os seus pares nos sínodos romanos; foi brilhante como escritor, devendo-se-lhe algumas obras que vão servir de referência para quem, no futuro, se debruçar sobre a realidade da Igreja em Portugal, sobretudo na segunda metade do século XX; foi brilhante como orador, sabendo juntar como poucos a profundidade do pensamento à beleza sonora da palavra que, assim, não apenas encantava o ouvido, mas penetrava no íntimo das mentes e dos corações; foi brilhante como amigo, conservando até ao fim esse dom maravilhoso que o levou a traçar, em dezenas de páginas, o perfil de Urbano Duarte, de Manuel Paulo, de Póvoa dos Reis e de tantos outros que com ele partilharam o saboroso pão do amor fraterno.
D. Manuel Trindade foi, além disso, um amigo de Coimbra e um amigo do seu semanário diocesano, onde publicou dezenas de artigos quer antes da sua elevação ao episcopado em 1962, quer depois de 1988, quando, tendo pedido e obtido a resignação do ministério episcopal em Aveiro, regressou às suas raízes para, serenamente, preparar o definitivo encontro com Deus.
O seu testemunho de fidelidade ao Evangelho, de acrisolado amor à Igreja e de fraterna e humilde partilha da amizade humana torna duradoira e benfazeja a sua memória. É a essa memória que me inclino profunda e piedosamente.
A. Jesus Ramos
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