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10 de março de 2009

Padre Luís Costa, presidente da Cáritas em entrevista ao “Correio”

"Trazer a Diocese à Cáritas e levar a Cáritas à Diocese"



. Entrevista de Miguel Cotrim



Correio de Coimbra (CC) - Quem é o Padre Luís Costa?
Padre Luís Costa (LC) - É, sem dúvida uma boa pergunta! Padre diocesano, ordenado há 10 anos, natural de uma pequena aldeia da freguesia de Figueira de Lorvão, Penacova. Comecei por servir cinco paróquias do arciprestado de Penela, durante dois anos; pediu-me depois a Igreja de Coimbra que fosse servir as paróquias do Seixo da Beira, Ervedal da Beira e Póvoa de Midões. Acumulei na altura o serviço de professor de moral no Agrupamento da Cordinha e a responsabilidade de dois Centros Sociais. Passados dois anos, pediu-me o D. Albino que fosse aprofundar conhecimentos em Direito Canónico, na Universidade de Salamanca. Durante dois anos, vivi a experiência das viagens entre o Seixo e Salamanca, aos domingos a ida e às sextas o regresso, mantendo, durante esse período, a pastoral de duas paróquias, Seixo e Ervedal, e a responsabilidade dos dois Centros. Depois de entregue a tesina, tive por concluída a licenciatura em Direito Canónico. Nessa altura a Diocese de Coimbra confiou-me o encargo de duas novas paróquias, Lagares da Beira e Meruge e com elas vieram mais duas Instituições Sociais. Passados outros dois anos, acumulava a responsabilidade de desempenhar o ofício de Juiz no Tribunal Canónico da diocese e a ajuda na implementação da Comissão Diocesana da Pastoral da Saúde. Na lógica de sucessivos ciclos de dois anos, chegou o momento de aceitar o enorme desafio da responsabilidade da Cáritas Diocesana. A alegria e a disponibilidade para o serviço da Igreja manifestadas na hora de aceitar cada um destes diferentes desafios, definem um pouco daquilo que sou.


CC -Dadas as dificuldades que atravessamos, sente-se preparado para abraçar este grande desafio?
LC -
"Preparado" é uma condição que não existe, porque nunca se está "preparado". No entanto, quero acreditar que com a ajuda da Graça de Deus e do contributo de todos aqueles que fazem parte deste projecto, seremos capazes de ultrapassar com distinção este verdadeiro teste às capacidades de homens simples. Queremos ser ocasião para fazer algo de belo neste momento da nossa história; sabemos que não o fazemos isoladamente, mas contamos com o contributo de todos, seja ela na crítica, ou no incentivo, na provocação ou animação.


CC - O número de pedidos de ajuda tem vindo a aumentar?
LC -
Naturalmente que sim. À nossa casa chegam os mais diversos e diferentes pedidos de ajuda. Estamos em muitos locais, desde a beira-mar até à Pampilhosa da Serra, por isso, somos ocasião para muitas solicitações. Neste momento, procuramos dar satisfação às respostas estruturais, sem esquecer todas as outras, embora reconhecendo que nem sempre é possível satisfazer todos os pedidos.


Crise: "A consequência económica é apenas um dos tentáculos desta "criatura" que criámos e continuamos a alimentar. Outras manifestações estão para chegar."




CC - Acha que houve uma distracção em relação aos sinais que já se vinham adivinhando da crise?
LC -
Não. Há muito que se adivinhavam as situações que vivemos agora. Estou em crer que só não se manifestaram antes devido à lógica de mercado que, especulando, conseguiu adiar o mais possível uma realidade incontornável. Vivemos uma crise civilizacional, como se diz por aí. A consequência económica é apenas um dos tentáculos desta "criatura" que criámos e continuamos a alimentar. Outras manifestações estão para chegar.


CC - Até que ponto as pessoas que davam donativos estão agora a pedir apoio à Caritas?
LC -
Há muitas pessoas que estão a pedir apoio que noutros tempos e circunstâncias não o fariam. Quem sempre apoiou a Cáritas, estou em crer, que continuará a apoiar, mesmo nestes tempos de crise, uma vez que sempre foram os mais pobres e os que mais precisavam que partilharam do seu em prol de causas que os tocava. Tenho esperança que, hoje mais do que nunca, vamos conseguir sensibilizar e mover o coração de homens e mulheres de boa vontade, apelando à sua generosidade em favor de causas pelas quais vale a pena tirar o pão da nossa própria boca para o dar àqueles que realmente precisam.


CC - Quem são as pessoas que estão a pedir ajuda?
LC -
Dizer que são aquelas que mais ninguém quer, seria, certamente, uma injustiça para com muitas instituições que trabalham ao nosso lado e connosco. No entanto, as áreas da toxicodependência, HIV, sem-abrigo, mulheres vítimas de violência são realidades que não despertam especial interesse à maioria das instituições. São áreas de intervenção de tal maneira deficitárias que só uma instituição como a Cáritas torna possível uma resposta adequada. Se ainda acrescentarmos a isto o facto da assistência que damos aos idosos de zonas profundamente envelhecidas, desertificadas e isoladas dos concelhos da Pampilhosa, Góis e Arganil, reconhecemos sem esforço as dificuldades inerentes a estas prestações de serviço.


CC - No que diz respeito ao desemprego, só no início deste ano encerraram cerca de 300 empresas, sente que estas possam estar a aproveitar a conjuntura para encerrar?
LC -
Não. Duas razões. O encerramento de uma empresa não afecta negativamente apenas aqueles que perdem o emprego, mas também aqueles que o geram. Conheço alguns dramas pessoais provocados pelo falhanço de negócios familiares de várias gerações. Também aí acontece o drama de ver morrer o sonho e projecto de toda uma vida. Ninguém desiste facilmente de um sonho.


"A Cáritas Diocesana de Coimbra emprega 700 funcionários e tem mais de 6 mil utentes."




CC - A Cáritas tem alguma proposta para responder a este problema?
LC - A Cáritas quer ser resposta a alguns desses problemas na medida das suas possibilidades e competências. No entanto, a Cáritas é também um problema em si mesmo, uma vez que emprega mais de 700 funcionários, o que significa outras tantas famílias, para além de mais de 6 mil utentes a quem presta serviço.


CC - Concorda, quando se diz que há muita gente habituada ao subsídio de desemprego?
LC -
Reconheço que protagonizamos um sistema que favorece e alimenta alguma injustiça em nome da justiça social. Há, nalguns casos, uma má justiça distributiva. Certo é que não há sistemas perfeitos e que haverá sempre alguns que se aproveitam das fragilidades dos mesmos, tornando-se o que chamo de "profissionais da pobreza". No entanto, estou em crer que a esmagadora maioria dos desempregados necessita e muito dessa "esmola" que a sociedade lhe dá, até que reconquiste um posto de trabalho, uma vez que este não é apenas uma fonte de sustento, mas um meio essencial para a realização de cada pessoa.


CC - Normalmente, as paróquias são os primeiros locais a que se recorre quando se passa por determinadas dificuldades… as paróquias da nossa diocese estão preparadas para a acção social?
LC -
Perante a realidade desta crise transversal que atravessamos faz sentido, mais do que nunca, promover o princípio da subsidiariedade, ou seja, o que pode ser feito por uma estrutura menor, não deve ser feito por uma estrutura maior. Entendo que se deve esgotar preferencialmente as estruturas próximas das pessoas, capazes de uma resposta rápida e concreta, muitas vezes com a colaboração e intervenção da pessoa que se quer ajudar. A estrutura paroquial é em si mesma expressão de tudo isto. Talvez não estejam devidamente preparadas, mas é aí que nascem e operam os grupos de voluntários de acção social; é aí que existem instituições que prestam um contributo decisivo para a acção social. Penso que devemos reforçar estas estruturas de base, pois é nelas que poderá assentar uma verdadeira e próspera recuperação das estruturas sociais.


CC - Que projectos tem para a Cáritas de Coimbra?
LC -
Nos tempos próximos espero concretizar três grandes objectivos. Primeiro, consolidar toda a orgânica subjacente a uma organização com dezenas de equipamentos, multifacetados entre si e com problemáticas diversificadas, uma vez que não podemos realizar tranquilamente a nossa verdadeira missão de ser instrumento de promoção e defesa da dignidade humana se continuamente estamos a olhar para a nossa própria sustentabilidade. Simultaneamente, espero devolver à Cáritas o espírito de missão, na pessoa de cada um dos seus colaboradores e na sua acção, no âmbito desta diocese de Coimbra. Que a Igreja de Coimbra se orgulhe da acção que a Cáritas protagoniza em seu nome. Trazer a Diocese à Cáritas e levar a Cáritas à Diocese é um grande desejo meu. Em consequência de tudo isto, esperamos conseguir ser uma ocasião de serviço ao homem de hoje, como instrumento e meio de toda uma sociedade preocupada com o que mais sofre.


CC - Vamos comemorar dentre de algumas semanas o Dia Nacional da Cáritas… Como irá ser vivido este dia na diocese?
LC -
Este ano, somos provocados por um desafio estrutural: "se não tiver caridade, nada sou". Digo estrutural porque é uma dimensão essencial para o cristão, mas não só, pois cada pessoa deve sentir-se mobilizado para agir em favor daquele que mais precisa. Ao nível diocesano, entendemos que a nossa caridade se deveria concretizar numa acção concreta em favor da grande causa da mulher que é vítima de violência. Neste sentido queremos envolver toda a sociedade na promoção da denúncia e combate a este drama de hoje e de sempre. Vamos lançar esta acção na nossa XXXIII Assembleia Diocesana para a Acção Social, já no próximo dia 8 de Março, procurando que a semana até ao dia 15, Dia Cáritas, seja marcada com gestos concretos de sensibilização, denúncia e apoio a todas as mulheres que são vítimas de violência. O nosso desejo maior é que esta mobilização não termine nesses dias, mas que se prolongue ao longo do ano, de modo a escrevermos uma nova página no livro da nossa civilização.

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