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13 de junho de 2008

Testemunhar o que somos


A assembleia do clero apontou, como uma das prioridades dos próximos anos, a formação dos leigos animadores de comunidades. Talvez se esperasse no ano dedicado a S. Paulo, "o apóstolo", uma aposta mais abrangente já que uma Igreja missionária, tendo a ver com todos os âmbitos da vida, deve cuidar da formação de todos os leigos (LG 31). Mas seja qual seja a opção, o importante é que seja séria. E quando digo séria, não estou a pensar no clero, mas no nosso estilo de pastoral muito ao jeito de "seja o que Deus quiser".
Uma primeira exigência tem a ver com o modo como o clero olha os leigos. Os leigos têm de ser levados a sério, como corresponsáveis pela missão da Igreja, companheiros de caminhada em quem se confia, a quem se recorre, em quem se acredita e a quem se dá espaço na decisão, planificação e execução das várias actividades (LG 37; GS 43). Isto é, como elementos indispensáveis, não por especial condescendência da hierarquia, mas por um direito próprio que decorre da consagração baptismal, comum a todos (AA 3). Esta é a primeira conversão que o nosso clero deve fazer: os leigos não podem ser olhados como simples criados ou executantes. Dizia Bento XVI no seu discurso aos nossos Bispos (lembram-se?): "É preciso mudar o estilo de organização da comunidade eclesial portuguesa e a mentalidade dos seus membros para se ter uma Igreja ao ritmo do Concílio Vaticano II, na qual esteja bem estabelecida a função do clero e do laicado, tendo em conta que todos somos um, desde quando fomos baptizados e somos corresponsáveis pelo crescimento da Igreja".
Passando à proposta séria ela deve ser actual, adequada e sistemática. Actual significa que tem de ter uma linguagem actualizada, mobilizadora e sedutora. Não se trata do conteúdo, mas da forma: o século XXI exige uma linguagem nova, diferente, em consonância com o mundo actual. De que vale saber todos os termos técnicos teológicos e catequéticos se eles nada dizem às pessoas de hoje? A linguagem é um dos desafios prioritários como recordava Bento XVI: "Talvez valha a pena verificardes a eficácia dos percursos de iniciação actuais, para que o cristão seja ajudado, pela acção educativa das nossas comunidades, a maturar cada vez mais até chegar a assumir na sua vida uma orientação autenticamente eucarística, de tal modo que seja capaz de dar razão da própria esperança de maneira adequada ao nosso tempo".
Mas não é só uma questão de linguagem. A generalidade dos cristãos, mesmo os de missa dominical, vive um cristianismo que se esgota numa ética humanista, esquecendo o essencial, cujo centro é o Sermão da Montanha que não é uma proposta para elites mas para todos os que querem ser seguidores de Jesus Cristo (NMI 51) e que Bento XVI resumiu numa frase lapidar: "No início do ser cristão, não há uma decisão ética ou uma grande ideia, mas o encontro com um acontecimento, com uma Pessoa, que dá à vida um novo horizonte e, desta forma, o rumo decisivo" (DCE 1). Demasiados têm uma ideia de Deus muito mercantilista, afastada do Deus-Amor, que é pai e mãe, que olha para nós não como pecadores mas como gente carenciada de salvação. Muitos não fazem ideia do que seja a eclesiologia da comunhão, cuja espiritualidade João Paulo II tão bem caracterizou (NMI 43).
Uma proposta séria deve ser adequada, isto é, adaptada aos leigos e aos diferentes modos como são chamados a testemunhar e a construir a comunhão e a missão da Igreja. Por exemplo, não é adequada, por muito científica que o seja, uma formação decalcada dos cursos teológicos que se dão nos Seminários. Embora a missão seja uma e a mesma (AdG 6), não serve a mesma "chapa" para clero, religiosos e leigos.
A proposta deve também ser sistemática. Há na nossa Diocese muitos e variados cursos, mas não há suficiente articulação entre eles, o que origina não só uma dispersão de esforços mas também multiplicação de iniciativas que poderiam ser perfeitamente evitadas.
Por outro lado, a formação não é um mero exercício intelectual. Não bastam, embora indispensáveis, as "Escolas de Leigos" e outros cursos. Primeiro, porque o "objectivo fundamental" da formação é "a descoberta cada vez mais clara da própria vocação e a disponibilidade cada vez maior para vivê-la no cumprimento da própria missão" (ChL 58). Segundo, porque a formação deve ser uma espécie de "discipulado", como que Jesus fez com os seus discípulos. E aqui os párocos têm um papel insubstituível. Esta formação exige um trabalho constante com um núcleo duro que poderia ser o Conselho Pastoral, começando pela Comissão Permanente, iria alastrando depois aos outros agentes pastorais e finalmente a toda a comunidade. Mas… isto pressupõe uma mudança radical nas opções dos nossos párocos, como dizem os nossos Bispos: "As actuais circunstâncias reclamam esta opção que talvez exija uma reconversão das prioridades pastorais dos sacerdotes de modo a deixarem aos leigos as tarefas não específicas dos pastores e a reservar à formação sistemática dos adultos o tempo e as energias que ela requer".
Sem estas duas conversões, a formação poderá produzir bons gestores de uma pastoral do betão, do turismo, mesmo de actividades, mas nunca uma pastoral da comunhão e da missão, a que a Igreja é hoje especialmente chamada.
O dramático é que o mais difícil no cristianismo é a conversão!


José Dias da Silva

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