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20 de novembro de 2007

O QUE EU VI E ESCUTEI EM ROMA (2)



A visita "ad limina" é a afirmação e o enraizamento na unidade de fé e no amor que nos liga, em Igreja, àquele que a preside, o Santo Padre. Mas a visita constitui também uma ocasião privilegiada para ouvir Pedro, isto é, conhecer as preocupações do seu sucessor, o Papa, e escutar, de viva voz, as suas orientações para as nossas Igrejas.
Já alguém escreveu que as primeiras visitas "ad limina" da nossa história foram as idas de S. Paulo a Jerusalém para estar com S. Pedro. São elucidativas as suas palavras: "Fui a Jerusalém para visitar Pedro e fiquei com ele quinze dias. (…) Catorze anos depois, subi outra vez a Jerusalém... e expus o Evangelho que prego entre os gentios, em particular aos mais considerados, com receio de correr ou de ter corrido em vão" (Carta aos Gálatas).
Este encontro com o Pastor de toda a Igreja e com os serviços que o ajudam, para aferir com eles os caminhos pastorais que temos seguido, é um exercício enriquecedor que nos deixa sempre motivados. É que o Papa ouve, comenta e aponta rumos.
De Coimbra lembrava-se bem o Santo Padre, que me elogiou a beleza da cidade. E nem seriam necessárias as duas páginas de resumo do nosso relatório que previamente lhe são fornecidas, para que o diálogo se fixasse na pastoral dos universitários. Assim, depois da caracterização da Diocese, com resposta às perguntas sobre o número de padres e seminaristas, o Papa partilhou a minha preocupação com as dificuldades em formar cristãmente médicos, advogados, gestores... Ainda que bastantes de entre eles alimentem ao domingo a sua fé nas paróquias a que pertencem, só uma pastoral de nível universitário é capaz de os preparar para um dia resolverem numa perspectiva cristã os problemas específicos que surgirem no exercício da sua profissão.
Diz-se que Bento XVI repreendeu os Bispos de Portugal... Não dei por isso. Mas aceito que, ao dirigir-se a todos nós, pastores, ele nos apontou, com a sua autoridade, caminhos exigentes para as nossas Igrejas. Ao afirmar que "é preciso mudar o estilo de organização da comunidade eclesial portuguesa e a mentalidade dos seus membros", definia-nos o rumo obrigatório para todos os nossos programas de futuro, diocesanos, paroquiais ou outros.
Este "mudar a mentalidade" supõe uma convicção nos valores da fé, vividos nos tempos modernos, e pede dinamismo apostólico a todos os cristãos. Efectivamente, nas preocupações que nós, Bispos, trouxemos de Roma, vem, logo à cabeça, o que lá se ouviu da boca de um deles: Não podemos gastar-nos "a gerir uma crise"; temos de passar "a lançar o futuro". Estas são perspectivas de pastores que acreditam na força do Espírito para conduzirem pelos caminhos de Cristo os que lhes foram confiados, caminhos de Cristo a percorrer no Séc. XXI.
A este propósito faço uma comparação. Na última tarde domingueira de Roma uma dúzia de Prelados des1ocámo-nos à igreja do Pópulo, onde se encontra sepultado o celebrado Cardeal de Alpedrinha, D. Jorge da Costa, de quem se celebra agora o V centenário da morte. O Sr. D. Manuel Clemente, autoridade em história, apresentou-nos então o perfil deste português, que foi grande em Roma. Foi grande, sim, na diplomacia eclesiástica e vaticana. Hoje, felizmente, as nossas preocupações são predominantemente pastorais.
Para lhes responder, valeu também uma dúzia de reuniões nas diversas Congregações Romanas, serviços que ajudam o Papa ao modo de ministérios. Nelas recolhemos orientações para apoiar os nossos Institutos Religiosos em dificuldades, a formação dos nossos catequistas (tão propensos a reduzir a vida cristã a um comportamento compreensivo de tudo o que apetece) e o acolhimento aos imigrantes de fé ortodoxa.
No Conselho Pontifício "Justiça e paz" doeram-nos as noticias sobre, o tráfico de armas no mundo; motivou-nos o que ouvimos sobre o diálogo com os não crentes, no Conselho Pontifício da Cultura; e foi-nos útil o que escutámos na Congregação da Educação Católica relativamente aos Institutos Superiores de Teologia.
Em tudo e sempre prevaleceu o propósito de construir o futuro com a esperança que nos vem de Cristo. Este foi também o sentimento experimentado na celebração junto ao túmulo de S. Paulo. Somos poucos? Envelhecidos? Cansados? Mas, ao, olhar para aquela pedra tosca que encerra os restos mortais de um idoso, preso e morto por uma paixão que o devorou até ao fim da sua vida, a paixão por Cristo, parecia-me ouvir o que ele escreveu na 2.ª Carta ao seu discípulo Tímóteo: "Não te envergonhes do testemunho de Nosso Senhor, nem de mim, seu prisioneiro; participa comigo nos trabalhos do Evangelho".
Estes são os apelos e os propósitos que se recolhem em Roma e se trazem na alma.


+ Albino Cleto,
Bispo de Coimbra

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