Mário Nunes
Américo Monteiro de Aguiar nasceu no lugar de Bairro, freguesia de Galegos, Penafiel, em 23 de Outubro de 1887, portanto, fazia ontem, 121 anos.
O pai encaminhou-o para o comércio, embora a mãe visse nele uma vocação para o sacerdócio. Uma loja de ferragens, no Porto, possibilitou-lhe conhecer o homem que lhe viria a abrir as portas para ser padre, o Cónego Dr. Manuel Luís Coelho da Silva, futuro Bispo de Coimbra. Primeiramente, e após ultrapassar as mais diversas fases da sua vida, incluindo ter vivido em Moçambique, quis ser frade franciscano. Chegou a tomar o hábito de noviço, porém, na altura da admissão na Ordem, foi rejeitado pelo Cabido. Abatido e desencorajado pediu admissão no Seminário do Porto, estabelecimento que, também, não o aceitou. Dirigiu-se a Coimbra e D. Manuel Coelho da Silva acolheu-o no Seminário e ali foi ordenado sacerdote. Devido ao esforço que fizera com os estudos, sentiu-se debilitado, fisicamente, e solicitou ao Prelado autorização para tratar dos pobres. Aí começou a sua cruzada de bem-fazer. A vontade de ser franciscano veio tornar-se realidade, porque se desprendeu de tudo e, tal como S. Francisco, entregou-se à missão de acudir aos desgraçados, marginalizados, carentes de amor, abandonados e doentes, iniciando a sua tarefa pela criação da Sopa dos Pobres, em Coimbra, prosseguindo com visitas a suas casas.
Bateu de porta em porta e de instituição em instituição, vindo a interessar-se pelos rapazes famintos de pão e de amor. As colónias de Férias ou de Campo do Gaiato da Rua ou da Baixa de Coimbra, em S. Pedro d´Alva e a seguir a sua grande obra, as "Casas do Gaiato", com a compra do edifício e terreno no concelho de Miranda do Corvo, por quarenta mil escudos, foi a sementeira para construir futuros, ou seja, somaram mais um marco na sua entrega aos pobres. Buscando o poema de Miguel Torga "Todo o semeador / semeia contra o presente / Semeia como um vidente / a seara do futuro / sem saber se o chão é duro / e lhe recebe a semente", vemos que Padre Américo foi um semeador de esperança, lançando a semente na "terra" dura, esperando, com esperança, colher os frutos.
Multiplicou as obras do gaiato, pelo País, Açores e África, utilizando na fundação o princípio que permanece: "dar às crianças o alimento (pão) como pretexto para educar para a vida", uma obra de rapazes, para rapazes e pelos rapazes, para formar homens de bem, honestos, trabalhadores, chefes de família, respeitados pela sociedade.
Lançada a semente arrancou com os Lares e o Património dos Pobres (construção de casas para abrigar as famílias a viver em condições infrahumanas), criando, mais tarde, o hospital de acamados, antecipando-se, em dezenas e dezenas de anos, aos hospitais de acamados que, actualmente, existem sob a responsabilidade de Instituições vocacionadas para o efeito, exemplo das Misericórdias. Ao criar o "Calvário" afirmou ser o seu último grito, o canto do cisne. E, não se enganou. A morte chegou, por acidente de automóvel, em Valongo, a 16 de Julho de 1956.
Nos últimos tempos, as Casas do Gaiato têm estado na Comunicação Social pelas mais diversas razões. Não compreendemos que senhores ou senhoras de gabinetes aquecidos e outros interesses pessoais e ou institucionais ponham em causa uma obra respeitável, grandiosa, humana e portadora dos mais extraordinários valores do Homem para o Homem. Somente, na minha opinião, por desconhecerem um percurso de amor, em prol da sociedade, daqueles que a mesma sociedade atira para os vícios, pobreza e morte, em vida. Mas, o Padre Américo, como samaritano, perdoa-lhes as ofensas feitas à sua memória e à obra que deixou na Terra.
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